O GOVERNO BÍBLICO DA IGREJA
Atos 20.28
Rev. João Ricardo Ferreira de França.
Em
nossos dias existe uma crise de identidade na Igreja evangélica atual. Crise do
ponto de vista doutrinária, os evangélicos de modo geral não sabem mais no que
creem, não existe mais a preocupação com um credo, ou com uma confessionalidade
estrita e clara.
A erosão da fé tem sido presente em
nosso tempo. A negação da suficiência da Palavra de Deus é patente em nossos
dias, e esta negação, não está vinculada a questão do pentecostalismo somente,
mas também a questão do governo eclesiástico da igreja; pois, se tem aceitado
que este tema é um campo periférico da teologia e que não devemos debater ou
contender sobre este valioso assunto.
Um escritor dá-nos uma alerta crucial
sobre isto, ao dizer:
É muito comum os crentes professos
fazerem distinção entre o essencial e o não essecial
em religião e inferir que, se algum fato ou doutrina pertence exatamente a
esta última classe, deve ser uma questão de pouca importância, e pode na
prática, ser seguramente relegada a um plano secundário. A maioria das pessoas
tira conclusões sem um exame prévio; não querem pagar o preço de pensar,
pesquisar, de raciocinar sobre nada e um dos expedientes mais frequentes
adotados por elas para se livrarem da responsabilidade de usar a mente e
desprezar algum fato que se julgue desagradável é dizer: “Esse problema não é
essencial para salvação; portanto, não precisamos nos preocupar muito com
isso”.[1]
As palavras deste pastor presbiteriano nos alerta para um
fato importante que é a marginalização de temas teológicos que são fundamentais
para a igreja de Cristo, e assim, a negligência sobre a temática do governo da
Igreja de Cristo torna-se mais evidente. Concentramo-nos em temas como: Revelação,
Expiação, Justificação, Regeneração; todavia, quando se vai tratar de governo
eclesiástico achamos algo se proveito, e somos até acusados de dogmatizadores
quando somos enfáticos neste assunto, mas uma vez Witherow nos alerta dizendo
“se todas as outras verdades reveladas são irrelevantes porque não são
essenciais para a salvação, o resultado é que o que o que se está sendo negado
é a importância da própria Palavra de Deus”.[2]
Quando se omite e julga-se irrelevante tais assuntos
ataca-se a doutrina da Suficiência das Escrituras. O Sola Scriptura e o Tota Scriptura
são desprezados nas considerações teológicas sobre esta temática. Por
isso, o nosso estudo aqui visa apresentar a importância, a atualidade e a
necessidade deste tema importantíssimo na vida da Igreja de Cristo.
Sabemos que “o tema Governo Eclesiástico não sugere nada
atraente”[3].
Isto devido a falta de literatura, de interesse e de disponibilidade dos
pastores em ler, produzir e ensinar sobre a eclesiologia. Alguém poderia
perguntar: “por que é importante estudar este assunto?” A resposta está no fato
de que o “ministério e a forma de governo constituem um dom de Deus para a
igreja”[4].
E esta é a razão suficiente para estudarmos a natureza do governo bíblico da
igreja.
Tudo isso nos leva para necessidade da Igreja em nossa
vida, estamos cientes de que existe em nossos dias protestos contra a Igreja e
que vivemos tempos no qual as pessoas dizem “‘queremos Deus, não uma
instituição’”[5];
embora tal declaração seja preocupante para nós o nosso estudo não se
concentrará nesta problemática, mas focalizará toda a atenção na questão do
governo bíblico da Igreja de Cristo.
I – A BÍBLIA E OS OFICIAIS GOVERNANTES DA IGREJA
A discussão sobre a eclesiologia começa quanto se procura
responder a seguinte questão: quem deve governar a Igreja de Cristo? A resposta
que damos a esta pergunta apresentará as nossas concepções sobre o governo
bíblico da Igreja. Se dissermos que a Igreja deve ser governada por um
pastor-presidente, ou por um único homem estaremos adotando uma postura de
governo conhecida como Episcopal.
A estrutura de governo Episcopal é adotada pela Igreja
Romana onde os sistema de bispo é introduzido, isto porque para eles o supremo
bispo da Igreja é o Papa! Mas, este sistema não está presente apenas na Igreja
Romana, ela se encontra em muitas igrejas evangélicas e protestantes. Onde se
adota a figura do bispo, apóstolo, e até do pastor presidente.
Agora, se a nossa resposta for a de que o povo governa
junto o sistema ai é o congregacional.
No sistema congregacional “todos tomam parte das decisões; e os erros também
são mais frequentes, pois, nem todos estão preparados para atuar em todos os
níveis de decisão”[6].
Há um adágio popular que diz “casa onde todo mundo manda, ninguém manda”, está
é a implicação lógica do congregacionalismo. As igrejas que sustentam este
sistema são as Igrejas Independentes ou Congregacionais e as Igrejas Batistas.
Uma terceira reposta tem sido dada a respeito de quem
deve governar a igreja de Cristo? A resposta é que alguns governam sobre todos
como representantes. O sistema é conhecido como representativo, ou sistema
presbiteriano de governo. As Igrejas Reformadas e Presbiterianas sustentam este
sistema de governo.
Neste sistema os membros elegem os seus oficiais que são
representantes pactuais. Estes oficiais eleitos formam seus concílios, que são
assembleias formadas por pastores e presbíteros. É a defesa deste sistema que o
nosso estudo procura fazer.
1.1 – O Governo Por meio dos Presbíteros.
1.1.1 – Definição do termo Presbítero:
No Novo Testamento os oficiais regentes da Igreja são
chamados de presbíteros. Antes de falarmos sobre a importância e o papel deles
na vida da Igreja precisamos esclarecer o que o termo significa.
O nome presbiterianismo
é derivado da palavra grega Presbyteros
que significa ancião ou presbítero. Em Atos 20.17 vemos que Paulo chama os
presbíteros “πρεσβυτέρους” [presbyterous]. O vocábulo indica aquele que tem experiência. Como
alguém já colocou que este termo indica que o presbítero é “um homem menos
moço, com mais idade do que o comum dos de um grupo ou congregação.Idade, no
sentido de vida mental, vida moral e vida espiritual, experiência, mais mesmo,
do que vida no tempo”.[7]
No Antigo Testamento encontramos os presbíteros como
líderes do povo pactual. Moisés quando é convocado por Deus para libertar o
povo se depara com a realidade presente dos presbíteros / anciões do povo de
Israel naquele tempo. Em Êxodo 3.16; em Números 11.16,24-25 temos a mesma
tônica presente. Por todo, o Antigo Testamento se verá os anciões/ presbíteros
presente na vida religiosa e civil do povo de Israel no Antigo Testamento.
[Dt.2119; Êx 24.1; Lv.4.15; Jz.8.14]
No Novo Testamento encontramos uma classe variada de
líderes. “os anciões”, “governadores” e “principais” ou “chefes da sinagoga”[8]
sabemos que durante o tempo de Cristo que a liderança judaica era corrupta a
mesma não deixou o oficio de presbítero desaparecer.[9]
[ Mt.15.2; Mc. 7.3; Jo.3.1; 7.26,48; Mc.5.22; Lc.8.41]. Este governo tem suas
raízes desde o Antigo Testamento por isso o Governo Presbiteriano é
essencialmente bíblico.
1.2 – Os Presbíteros: Os Oficiais Qualificados para governarem a Igreja de Cristo.
Nesses dias de imediatismo tendemos a escolher como
nossos líderes pessoas não qualificadas para tamanha responsabilidade; muitas
das nossas escolhas, neste particular, estão motivadas pela simpatia, amizade,
coleguismo ou por ser alguém que sabe falar bem, e assim, julgamos ser
necessário para ocupar o lugar de líder na igreja.
Outro ponto é que muitas pessoas pensam que todo e
qualquer homem pode ser líder da Igreja de Cristo. Kevin Reed nos diz que não
“basta haver homens meramente nomeados com o título de presbíteros. Eles devem
antes ser qualificados para governar, como demonstram os critérios das
Escrituras para os oficiais.”[10]
Desde o Antigo Testamento os líderes eclesiásticos deveriam ser qualificados
para ocupar tal ofício. Tinha que ser:
a)
Sábios e Experientes (Dt.1.13)
b)
Homens íntegros e verdadeiros (Êx 18.21).
No Novo Testamento essas exigências ficaram mais
intensas. Essa cobrança e intensidade se vê presente nas cartas de Paulo ao
jovem pastor Timóteo e a Tito. São qualificações indispensáveis para os
presbíteros da Igreja de Cristo Jesus. O apóstolo apresenta três áreas
importantes na vida de um homem qualificado para o presbiterato, estas
qualificações precisam ser enfatizadas para que a igreja não sofra no futuro.
1.2.1 - Devem ser homens qualificados na vida moral.
O texto de 1ª Timóteo assegura que aquele que deseja ser
presbítero é “necessário” (1ª Tim.3.2). Ele deve ser um exemplo no caráter,
pois a qualificação é que seja alguém:
a)
Irrepreensível:
Ele nãoi deve
ser alguém que vivemos corrigindo por suas falhas de caráter ou de
comportamento é isso que o grego exige daquele que se diz qualificado para tal
ofício seja alguém livre de reprovação “ἀνεπίληπτον”[anepilepton].
b)
Possuir uma relação monogâmica:
O ser “esposo de
uma só mulher”. Aponta para a realidade que naquela igreja havia muitos homens
que vieram do paganismo com suas mulheres [ eram membros com mais de uma esposa
], mas Paulo alerta a Igreja que o oficial da igreja, o líder deve ser um
exemplo de marido fiel para com sua esposa, tendo uma relação monogâmica.
“temperante, sóbrio, modesto, hospitaleiro,” aqui o apóstolo Paulo mostra
que o presbítero deve ser alguém pacificador, alguém que não gosta de intrigas
– ele usa a ideia de ser “temperante”;
outra qualidade expressa é a da sobriedade – alguém que não dominado pelo
vinho. Alguém modesto que não ostenta ser alguma coisa, alguém que procura
parecer, e por fim, deve ser hospitaleiro.
Um presbítero deve ser acolhedor, deve receber em casa, e receber bem os
membros, viajantes e os que carecem de acolhida, pois, se assim não for, não
deve ser eleito para o oficio de presbítero.
1.2.2 – Devem Possuir conhecimento
doutrinário:
O segundo requisito para ser oficial da Igreja de Cristo
é que este homem deve ser “apto para ensinar” (1ª Timóteo 3.2)
e para “admoestar com a sã doutrina como
para convencer os contradizentes”(Tito 1.9). O homem que é chamado para exercer o dom do
presbiterato na Igreja deve ser acima de tudo um teólogo, um homem com uma
mente aguçada em temas teológicos; deve ser alguém que ama ler livros, estudar
teologia. O presbítero tem por obrigação refutar as heresias e os falsos
ensinos.
1.2.3 – Devem possuir uma família
estável:
O apóstolo Paulo 1ª Timóteo 3.5 aquele que almeja a obra
do episcopado deve possuir uma família modelo; uma família que ele governe bem
para que possa saber como lidar com a Igreja de Deus em questões cruciais. Ele
deve saber conduzir sua família no reino de Deus. Pois, um “homem que falha em
influenciar piedosamente sua família, não está apto ao cargo público de oficial
da igreja”[11].
Este oficial não pode ser um neófito na fé (1ª Timóteo
3.6) porque o tempo e a experiência devem ser os aliados daqueles que são
chamados para o santo ofício do presbiterato. A igreja deve procurar essas
qualidades nos seus futuros oficias para que não escolham o candidato errado
para ocupar o oficio eclesiástico da Igreja (1ª Timóteo 5.22)
II – A BÍBLIA E A PLURALIDADE DE PRESBÍTEROS NO GOVERNO ECLESIÁSTICO.
O segundo aspecto de nosso estudo tem haver com a
seguinte questão: Quantos presbíteros deve haver em cada congregação? Outra
pergunta importante é sobre a relação entre o pastor e presbítero? O Pastor é
maior que o presbítero? Essas são perguntas pertinentes ao nosso assunto.
2.1 – A Pluralidade de Presbíteros.
No sistema presbiteriano é caracterizado pela “pluralidade
de presbíteros”[12];
esta pluralidade é fundamentada nas Escrituras Sagradas, pois, é-nos ensinado
na Palavra de Deus que em cada Igreja formada por Paulo deveria haver mais de
um presbítero.
No livro de Atos de imediato descobrimos a figura do
presbítero eleito pela comunidade cristã (Atos 14.23). No texto grego temos a
palavra “Χειροτονήσαντες”[cheirotonesantes] que tem os sentido de fazer uma escolha pública
levando a mão. Sem contar que ainda em Atos 20.17 o Apóstolo Paulo havia
chamado os presbíteros [nota-se que no plural] para que os mesmos se
encarregassem de seus deveres de supervisores e pastores da igreja de Cristo
conforme vemos em Atos 20.28.
Na sua Carta a Tito Paulo designa-o para que
estabelecesse presbíteros [plural] em cada cidade. [Tito 1.5]; então, nas
igrejas deve haver mais de um presbítero para governar a Igreja de Cristo.
2.2 – As distinções entre os Presbíteros.
Outra questão que precisa ser considerada diz respeito as
distinções dentro da classe de oficiais chamada de presbíteros.
Dentro dessa classe de oficiais, existem
duas ordens (1Tm 5.17). Aos presbíteros
regentes é confiada, especificamente a tarefa de administrar a ordem e a
disciplina em uma igreja específica; além disso, eles são conclamados a
‘cultivar zelosamente sua própria aptidão para ensinar a Bíblia e devem
aproveitar cada oportunidade de assim fazer (BCO 8-90). Os Presbíteros Docentes são aqueles que, além da responsabilidade de
administrar a igreja, têm ainda à função de alimentar o rebanho pela leitura,
explanação e pregação da Palavra de Deus
e a ministração dos sacramentos (BCO 8-50). Os presbíteros docentes às vezes
são chamados ministros da Palavra. Os presbíteros docentes, como também os
regentes, são duas ordens dentro da mesma classe de oficiais; ambos possuem ‘a
mesma autoridade e elegibilidade para atuar nos concílios da igreja (BCO 8-9)[13]
Calvino comentando o texto de 1ª Timóteo 5.17 nos diz o
seguinte:
À luz desta passagem podemos inferir que
há dois tipos de presbíteros, visto
que nem todos são ordenados para a docência. O significado cristalino das
palavras está no fato de que havia alguns que governavam bem e de forma
honrosa, no entanto, não eram detentores da função pedagógica. Elegiam-se
homens solícitos e bem preparados, os quais, juntamente como os pastores num
concílio comum, e investidos de autoridade delegada pela Igreja, se destinavam
a ministrar a disciplina e a agir como censores com vistas à disciplina moral.[14]
A distinção dentro do presbiterado tem sido reconhecida
pela igreja de Cristo desde muito cedo, o presbítero docente é também conhecido como Pastor, ministro da palavra.
2.3 – As Distinções entre os Presbíteros e Pregação da Palavra:
Diante disso tudo surge uma pergunta: se há duas classes
de presbíteros na Igreja de Cristo quem deve pregar a Palavra? O presbítero
regente pode pregar a Palavra à Congregação?
Na Reforma Protestante se debateu muito sobre isso, e os
teólogos reformados apresentaram uma resposta sobre o tema em seus símbolos de
Fé.
“[...] que os mistérios das Escrituras sejam diariamente
expostos e explicados por ministros
qualificados [...]”
“Dita Igreja não
reconhece outro ministro exceto aquele que Prega e administra os sacramentos”
“Nós não reconhecemos
a outros pastores na Igreja senão aos pastores fiéis da Palavra de Deus, que
alimentam as ovelhas de Cristo [...]” “Nós cremos que os Ministros da Palavra de Deus e os
Presbíteros e Diáconos, devem ser eleitos
aos seus respectivos ofícios mediante uma eleição legal da Igreja [...]”
“[...] nós cremos que a ordem da Igreja, estabelecida por sua
autoridade, deve ser sagrada e inviolável, e que, portanto, a Igreja não pode
existir sem pastores para a instrução,
a quem devemos respeitar e escutar reverentemente, quando eles tem sido
chamados de maneira apropriada e exercem seu ofício fielmente”.
Todas as confissões aqui de forma incontestável
estabelecem que o pastor é o único ministro da Palavra que possui a
prerrogativa de proclamação como de
ministração dos sacramentos [ Batismo e Eucaristia].
PERGUNTA 158: Por quem deve ser pregada a Palavra de Deus?
RESPOSTA: A Palavra de Deus deve ser pregada somente pelos que foram
suficientemente dotados e devidamente aprovados e chamados para tal ofício.
O nosso catecismo reconhece que apenas os Ministros da Palavra
devem pregar. O ponto fundamental aqui é que muitas de nossas igrejas fazem
escalas da pregação para que os presbíteros regentes preguem, um diácono, um
seminarista e assim por diante, mas os padrões de Westminster, de modo
particular, o catecismo Maior reconhece que a Palavra de Deus deve ser pregada SOMENTE
PELOS QUE FORAM suficientemente dotados
e devidamente aprovados e chamados para tal ofício.
Isso tem gerado muito debate nos círculos evangélicos da
atualidade – a publicações de livros que incentivam a pregação leiga tem
abarrotado as livrarias de modo geral. Mas, precisamos dizer que a pregação
leiga não é bíblica, não tem apoio da tradição reformada, e não é autorizada
pelos padrões confessionais.
David Martyn Lloyd-Jones nos lembra algo interessante
sobre este assunto:
[...] Quem deve realizar a Pregação? O
primeiro princípio que gostaria de afirmar é que nem todos os crentes são
destinados a fazer isso, nem todos os
homens crentes devem pregar, e de maneira alguma as mulheres! Noutras palavras,
precisamos considerar o que se chama ‘pregação leiga’. Isto já vem sendo
praticado de modo bastante comum há cem anos ou mais. Antes, era uma prática
comparativamente rara, mas hoje é muito comum. Seria interessante examinamos a
história dessa prática, mas o tempo impede de fazê-lo. Novamente, o mais
interessante a ser observado é que esta mudança resultou de causas teológicas.
Foi a mudança na teologia do século passado, de uma atitude reformada e
calvinista para uma postura essencialmente arminiana,
que provocou o aumento da pregação de leigos. A explicação dessa causa e efeito
é que, em última análise, o arminianismo é não-teológico. Eis porque a maioria
das denominações evangélicas da
atualidade são igualmente não-teológicas. Sendo esse o caso, não deve nos
surpreender o fato de que predominem em nossos dias o ponto de vista de que a
pregação está aberta a todo homem e posteriormente, a qualquer mulher. Minha
asserção é que esta é uma perspectiva antibíblica sobre a pregação.[15]
A pregação leiga – homem da igreja, presbítero regente,
diácono, seminarista – é fruto da perspectiva arminiana que deseja dar aos
‘novos convertidos o que fazer na igreja’, e assim, ignorando completamente a
noção de vocação para o ministério da Palavra.
O dr. Vos comentando a pergunta 158 do Catecismo Maior de
Westminster lembra-nos que:
Quem não for ministro ordenado ou
licenciado pode testemunhar de Cristo em particular ou em público, conforme a
oportunidade o permita, mas a pregação pública oficial da Palavra na Igreja
deve ser feita apenas por aqueles devidamente separados para esta obra. Claro
está que a pregação da Palavra é uma obra de importância muito grande. São
necessárias as qualificações apropriadas para que seja feita de maneira
adequada. Há qualificações espirituais, intelectuais e educacionais sobre as
quais se deve insistir para que a igreja tenha um ministério adequado. [16]
Esta posição confessional da Igreja é a posição histórica
do presbiterianismo, o Dr. Roger Smalling responde a questão do catecismo Maior
de Westminster sob os seguintes termos:
Aparece uma ligeira ambigüidade nesta declaração.
Tradicionalmente, se tem entendido que o Catecismo Maior de Westminster delega
aos Presbíteros Docentes ordenados, ainda que, o termo Pastor ou Ministro não
se use aqui. Mas, depois disto tudo, que aconteceria se um Presbítero Regente
pudesse pregar melhor que um Presbítero Docente qualquer? A Assembleia da PCA[17] de
1979 responde:
Recomendação Nº 4:
A Assembleia Geral reafirma a posição
Presbiteriana histórica conforme expressa no Catecismo Maior em sua pergunta
158, que ninguém deve pregar o Evangelho senão aqueles que são chamados e
dotados por Deus; e que, por conseguinte, somente aqueles homens que são
apropriadamente ordenados ou licenciados podem pregar nos púlpitos da PCA; e
que aos Presbíteros Regentes se lhes permite e anima a renovar a prática
histórica de exortar ao povo de Deus. (Adotado, p.457-458).
Esta recomendação uni-se com a
recomendação de Número 5 que trata da relação do Pastor com o Conselho. Disto
nós vemos que a PCA considera o púlpito como o domínio habitual do Presbítero Docente,
não obstante, o Presbítero Regente pode exercer qualquer dos dons ministeriais
de exortação que possua em outros domínios e circunstâncias. Na PCA, não se
aceita a prática de programar dentro das agendas de pregação regulares da
igreja, aqueles que não são ordenados como Presbíteros Docentes.[18]
Será que existe alguma
evidência Bíblica para a posição de que apenas os presbíteros docentes
[ministros, pastores, bispos] proclamem a palavra de Deus no culto público?
O ponto é que a pregação neotestamentária é marcada pelo
ensino. O verbo grego didaskw – didaskô –
[ensino] é usado noventa e sete vezes no
Novo Testamento. No uso deste verbo pode-se classificar o seguinte: Quando se
refere à fé cristã: este verbo “didaskw” tem como sujeito o Senhor Jesus, sendo usado 48
vezes (Marcos.8.31 e 9.31); os apóstolos (dezoito vezes), o Espírito Santo
(Lucas 12.12; João 14.26; 1 João 2.27); Timóteo (1
Timóteo 4.11 e 6.2); João
Batista (Lucas 11.1); o cego que havia sido curado por Jesus , o qual foi
acusado pelos fariseus de estar querendo
ensiná-los (João 9.34); Apolo que ensinava de modo preciso na sinagoga (Atos
18.25)[19]
Todas as referências nas quais este verbo aparece parece
indicar ofício específico do ministro da palavra.
Agora
um vocábulo que aparece na Palavra de Deus que parece ser imperativo nesta
questão é o termo Arauto. No grego
temos a palavra “khrux”- keryx – aponta
para aquele que leva uma mensagem autorizada – um porta-voz oficial. Qual é o
sentido do emprego desta palavra, era usada para descrever “o homem que é
comissionado pelo seu soberano, ou pelo estado, para anunciar em voz alta
alguma notícia, a fim de torná-la conhecida”.[20]
O uso do verbo relacionado a esta função de arauto “kerussw”- keryssô – e na leitura que fazemos do Novo Testamento nós
percebemos o seguinte que o uso deste verbo se aplica:
a) Apenas a Cristo ou a
alguém comissionado por Deus para o ministério da pregação ( Romanos 10.15; pois, somente estes têm a
autoridade divina de se apresentar publicamente para falar em nome de Deus.
b) Nos Evangelhos apenas
João Batista é assim apresentado como proclamador enviado da parte de Deus(Mt
3.1: Mc. 1.4; Lc.3.3) – sendo ele um profeta do antigo pacto.
c) Jesus é apresentado como
o proclamador supremo (Mt.4.17,23;9.35;11.1; Mc1.14,38,39; Lucas
4.18,19,44.8.1)
d) Os apóstolos
comissionados por Jesus (Mt.10.7,27; Mc 3.14; 6.12; 16.15,20; Lc.9.2;
12.13.).
Todos estes textos apresentam que os sujeitos do verbo “kerussw”- keryssô eram comissionados pelo Senhor. Paulo Anglada nos lembra:
Sempre que outras pessoas aparecem como
sujeitos do verbo “kerussw”- keryssô
nos evangelhos, estão desobedecendo a Cristo e, nesses casos, o conteúdo da
pregação deles é uma cura. Há três
exemplos dessas pregações desautorizadas nos evangelhos. Um deles é em Marcos 1.45, quando o leproso é
expressamente proibido por Jesus, saiu propalando que havia sido curado, de
sorte que Jesus acabou impedido de entrar livremente na cidade. Outra
ocorrência é encontrada em Marcos 5.20
e Lucas 8.39, onde se ler
que o endemoninhado geresareno, libertado por Jesus, ao invés de apenas relatar
o acontecido (;agge,llw [angello], em Marcos e dihge,omai [diegeomai]
em Lucas) aos seus familiares (a sua casa), como Jesus havia ordenado, saiu a
proclamar (“kerussw”- keryssô)
como arauto o acontecimento na cidade em que vivia. O último exemplo, em Marcos
7.3, refere-se às pessoas que haviam presenciado a cura de um surdo mudo,
também contrariando a ordem expressa de Jesus de não contarem (le,gousin - legousin)
a ninguém o ocorrido.[21]
Então está claro que apenas os que são chamados para a
pregação – proclamação – são os ministros [presbíteros docentes] e que ninguém
mais pode se intrometer neste ofício e ministério, se não for vocacionado. Mas
devemos ressaltar o que diz Samuel Miller em seu livro O Presbítero Regente que: “Deve-se considerar o presbítero regente,
não menos que o presbítero docente (i.e., pastor), age sob a autoridade de
Cristo em tudo que legitimamente faz.”[22]
REFERÊNCIAS BÍBLICAS
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Uma investigação Histórica sobre o
Modelo Bíblico-Reformado de pregação. Ananindeua: Knox Publicações, 2005,
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2.
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Graciano Martins. São Paulo: Parakletos, 1998, p.148.
3.
COENEN,
Lothar, “khru,ssw”. In: Dicionário
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Colin Brown, Tradução de Gordon Chown. São Paulo: Editora Vida Nova, 1993,
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Gerson Correia de Lacerda. São Paulo: Associação Evangélica Literária Pendão
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6.
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7.
LUCAS, Sean Michael. O Cristão Presbisteriano – Convicções, Práticas e Histórias.Tradução: Elizabeth Gomes. São
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8.
MARTINS,
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São Paulo: Casa Editora Presbiteriana, 1970.
9.
MILLER, Samuel. O Presbítero
Regente – Natureza, Deveres e
Qualificações. Tradução: Marcos Vasconcelos, São Paulo: Os Puritanos, 2001.
10. NASCIMENTO, Adão Carlos e MATOS,
Alderi Souza de. O que todo Presbiteriano
Inteligente deve Saber. São Paulo: Socep, 2007.
11. REED, Kevin. Governo Bíblico de Igreja. Tradução: Adelelmo Fialho. São Paulo: Os
Puritanos, 2002.
12. SMALLING, Roger. As Distinções Entre
os Presbíteros Docentes e Regentes. Tradução: João Ricardo Ferreira de França.
São Raimundo Nonato – Piauí: Centro de Estudos Presbiterianos, 2011.
13. VOS, Johannes Geerhardus. Catecismo Maior Comentado. Tradução:
Marcos Vasconcelos. São Paulo: Editora Os Puritanos, 2007.
14. WITHEROW, Thomas. A Igreja Apostólica – Que significa Isto? Tradução:
Francisco Cardoso. São Paulo: Os Puritanos, 2005
[1]
WITHEROW, Thomas. A Igreja Apostólica –
Que significa Isto? Tradução: Francisco Cardoso. São Paulo: Os Puritanos,
2005, p.9
[2] Ibid, p. 10.
[3]
REED, Kevin. Governo Bíblico de Igreja.
Tradução: Adelelmo Fialho. São Paulo: Os Puritanos, 2002, p. 7.
[4]
LEITH, John H. A Tradição Reformada – Uma
Maneira de ser a Comunidade Cristã. Tradução: Eduardo Galasso Faria e
Gerson Correia de Lacerda. São Paulo: Associação Evangélica Literária Pendão
Real, 1997, p. 244.
[5]
DE YOUNG, Kevin & KLUCK, Ted. Porque
amamos a Igreja. Tradução: Emirson Justino. São Paulo: Mundo Cristão, 2010,
p.14.
[6]
NASCIMENTO, Adão Carlos e MATOS, Alderi Souza de. O que todo Presbiteriano Inteligente deve Saber. São Paulo: Socep,
2007, p.75.
[7]
MARTINS, Francisco. O Ofício de Presbítero
– Origens, história, evolução e funções.
São Paulo: Casa Editora Presbiteriana, 1970, p. 15.
[8]
REED, Kevin. Governo Bíblico de Igreja.
Tradução: Adelelmo Fialho. São Paulo: Os Puritanos, 2002, p. 14.
[9] Idem.
[10]
REED, Kevin. Governo Bíblico de Igreja.
Tradução: Adelelmo Fialho. São Paulo: Os Puritanos, 2002, p. 16.
[11]
REED, Kevin. Governo Bíblico de Igreja.
Tradução: Adelelmo Fialho. São Paulo: Os Puritanos, 2002, p. 17.
[12] Ibid, p.19.
[13]
LUCAS, Sean Michael. O Cristão
Presbisteriano – Convicções, Práticas e Histórias.Tradução: Elizabeth
Gomes. São Paulo: Cultura, 2011, p. 141.
[14] CALVINO, João. As Pastorais. Tradução: Valter Graciano Martins. São Paulo:
Parakletos, 1998, p.148.
[15] LLOYD-JONES, David Martyn. Pregação e Pregadores. Tradução: João
Bentes Marques. São Paulo: Editora Fiel,
2008, p.97-98
[16]
VOS, Johannes Geerhardus. Catecismo Maior
Comentado. Tradução: Marcos Vasconcelos. São Paulo: Editora Os Puritanos,
2007, p.508.
[17]
PCA = Igreja Presbiteriana da América.
[18]
SMALLING, Roger. As Distinções Entre os
Presbíteros Docentes e Regentes. Tradução: João Ricardo Ferreira de França.
São Raimundo Nonato – Piauí: Centro de Estudos Presbiterianos, 2011, p. 11.
[19] ANGLADA,
Paulo. Introdução à Pregação Reformada –
Uma investigação Histórica sobre o
Modelo Bíblico-Reformado de pregação. Ananindeua: Knox Publicações, 2005,
p.33.
[20]
COENEN, Lothar, “khru,ssw”. In: Dicionário Internacional de Teologia do Novo
Testamento, vol.3, Ed. Lothar Coenen e Colin Brown, Tradução de Gordon
Chown. São Paulo: Editora Vida Nova, 1993, p.741.
[21] ANGLADA,
Paulo. Introdução à Pregação Reformada –
Uma investigação Histórica sobre o
Modelo Bíblico-Reformado de pregação. Ananindeua: Knox Publicações, 2005,
p.38-39.
[22]
MILLER, Samuel. O Presbítero Regente
– Natureza, Deveres e Qualificações.
Tradução: Marcos Vasconcelos, São Paulo:
Os Puritanos, 2001, p.14.
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